Com o aumento da expectativa de vida e a crescente tendência de pessoas recomeçarem a vida afetiva após o divórcio ou a viuvez, tornou-se comum o casamento entre pessoas com mais de 70 anos. No entanto, muitos desconhecem que, nesses casos, a lei impõe um regime específico de bens. Neste artigo, você vai entender o que é a separação obrigatória de bens para maiores de 70 anos, quais são seus efeitos patrimoniais, o que dizem a legislação e o Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema, além de descobrir se é possível alterar esse regime.
O que é a separação obrigatória de bens?
A separação obrigatória de bens é um regime matrimonial imposto por lei em determinadas situações, nas quais o legislador entende haver a necessidade de uma proteção especial ao patrimônio dos cônjuges. Diferente da separação convencional, que é escolhida livremente pelos noivos, a separação obrigatória não permite acordo entre as partes, ela é determinada por imposição legal.
A aplicação da separação obrigatória está prevista no artigo 1.641 do Código Civil, que determina sua incidência nos casamentos de:
- Pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;
- Pessoas maiores de 70 anos;
- Pessoas que dependerem, para casar, de suprimento judicial.
O objetivo dessa imposição é evitar fraudes, proteger o patrimônio de pessoas em situação de vulnerabilidade e garantir maior segurança jurídica às relações patrimoniais.
Quais são os efeitos patrimoniais da separação obrigatória de bens?
A separação obrigatória de bens pode impactar significativamente a vida patrimonial do casal. Entender esses efeitos é essencial para evitar surpresas em caso de divórcio ou falecimento de um dos cônjuges.
Divórcio na separação obrigatória de bens
Em regra, o regime da separação obrigatória de bens impede a comunicação patrimonial entre os cônjuges. Isso significa que, em caso de divórcio, cada um permanece proprietário exclusivo dos bens que adquiriu.
No entanto, essa regra tem uma importante exceção reconhecida pela jurisprudência. A Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal dispõe que: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento.”
Com base nessa súmula, a jurisprudência tem reconhecido a divisão dos bens adquiridos durante o casamento, mesmo sob a separação obrigatória. Essa divisão, contudo, conforme interpretação atual da súmula, exige prova de esforço comum, ou seja, demonstração de que ambos contribuíram para a aquisição do patrimônio.
Por isso, no momento do divórcio, o cônjuge que desejar a partilha dos bens comprados após o casamento deve provar a sua participação no crescimento patrimonial do casal.
Já os bens particulares, ou seja, aqueles que cada um já possuía antes do casamento, continuam pertencendo exclusivamente ao seu respectivo titular, sem qualquer direito de partilha pelo outro.
Herança e direitos sucessórios entre os cônjuges
No regime de separação obrigatória de bens, o cônjuge sobrevivente não herda em concorrência com os descendentes do falecido. Isso significa que, se houver filhos, por exemplo, apenas eles serão os herdeiros. O cônjuge sobrevivente só será considerado herdeiro se o falecido não tiver deixado descendentes.
Contudo, é importante diferenciar herança de meação. A meação é o direito à metade dos bens adquiridos durante o casamento, desde que se comprove o esforço comum para a aquisição desses bens, nos termos da Súmula 377 do STF.
Portanto, o cônjuge pode não ser herdeiro, se concorrer com os descendentes, mas ainda assim pode ter direito à meação, dependendo da origem dos bens e da prova de colaboração mútua na construção do patrimônio comum.
Se concorrer com ascendentes ou for o único na linha de sucessão legítima, ele será herdeiro, independentemente do regime de casamento.
Entendimento do STF sobre a separação obrigatória de bens para maiores de 70 anos
Conforme dito acima, o artigo 1.641, inciso II, do Código Civil impõe a separação obrigatória de bens para pessoas com mais de 70 anos que desejam se casar.
Embora a regra pareça rígida, o Supremo Tribunal Federal lançou nova luz sobre o tema ao julgar o Recurso Extraordinário 1.306.624/SP, com repercussão geral, em fevereiro de 2024.
Conforme a tese do Tema 1236, a Corte decidiu que:
“Nos casamentos e uniões estáveis envolvendo pessoa maior de 70 anos, o regime de separação de bens previsto no art. 1.641, II, do Código Civil, pode ser afastado por expressa manifestação de vontade das partes, mediante escritura pública.”
Dessa forma, pessoas com mais de 70 anos podem escolher livremente o regime de bens no casamento ou na união estável, afastando a imposição legal da separação obrigatória prevista no Código Civil. Para isso, é necessário formalizar a escolha por escritura pública em cartório.
Isso porque a Corte entendeu que a separação obrigatória por idade viola o direito de autodeterminação de pessoas plenamente capazes e configura discriminação etária, vedada pela Constituição Federal.
Possibilidade de mudança do regime de bens
O STF também definiu que casais já casados ou em união estável nessa faixa etária podem alterar o regime de bens.
No casamento, a modificação exige autorização judicial. Isto é, o casal no qual um dos cônjuges possui mais de 70 anos e, por isso, casou sob o regime de separação obrigatória, pode alterar o regime de bens mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, ressalvados os direitos de terceiros.
Já na união estável, o procedimento é mais simples: basta lavrar uma escritura pública em cartório manifestando a vontade do casal.
Em ambos os casos, a mudança só produzirá efeitos para o futuro, preservando as regras aplicadas ao patrimônio adquirido antes da alteração.
Conclusão
A separação obrigatória de bens para maiores de 70 anos sempre gerou controvérsias. Com o julgamento do STF, o cenário jurídico mudou. A Corte reconheceu que a idade, por si só, não pode limitar o direito de escolher o regime de bens, garantindo mais autonomia e respeito às decisões individuais.
Contar com a orientação de um advogado especializado em Direito de Família é fundamental para garantir que decisões importantes, como a escolha ou alteração do regime de bens, sejam tomadas de forma segura. Esse profissional não apenas esclarece direitos e deveres, mas também orienta sobre as consequências jurídicas de cada decisão, evitando prejuízos patrimoniais e conflitos futuros.
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